quarta-feira, 30 de junho de 2010

O diário da tua ausência

Dia 16
A gata que queria ser pessoa

Era uma gata aparentemente como outra qualquer. Quatro patas, um rabo, umas orelhas sempre atentas e que miava, miava muito. Era toda preta, toda não, tinha uma mancha branca na barriga. Era gorda e pesada, embora fosse ainda muito jovem. A verdade é que teve de ser operada, pois quando lhe deu o primeiro cio miava sem cessar a ponto dos vizinhos chamarem a polícia. Talvez por isso estivesse assim gorda. Também sabia fazer Adho Mukha.
Mas tudo isto é normal num gato. Especialmente de apartamento.
A diferença é que falava.
Começava bem cedo, aí pelas 5 da manhã a pedir para lhe abrirem a porta e darem atenção que já era hora de acordar. Depois queria brincar e pedia trazendo o patinho feio para a beira dos donos, insinuando-se para que o atirassem. Quando queria ir à varanda da sala comer erva pedia que lhe abrissem a porta Quando os donos se preparavam para sair dirigia-se à porta da entrada e pedia para ir com eles, fosse ao cinema ou simplesmente para levar o lixo.Tudo isto ela sabia fazer e muito mais. Quando o brinquedo ia para debaixo do sofá pedia que o tirassem. Também pedia para ir para o armário roupeiro do quarto. Quando os donos chegavam a casa pedia muitos mimos e quando voltavam de férias ralhava por a termos deixado. Quando estava aflita para ir à casa de banho pedia por favor para lhe porem areia com urgência. Não chegava ao ponto da gata da mãe de um amigo meu, que por os ver a usar a sanita, também passou a usá-la. Um dia ele viu a gata sentada a fazer xixi. A Rosa não chegava a esse ponto, mas se a ensinássemos certamente o faria.
O que ela tinha era muita pressa em ser humana. Um dia disse-me, olhando-me com aqueles olhos abertos como faróis: sabes, estou a aprender com vocês porque muito em breve irei ser pessoa. Espero nessa altura nascer com menos pêlos! Eu acrescentei: espero também que nasças menos autoritária, porque se nós deixássemos, eras tu que mandavas cá em casa.
Penso que num futuro é inevitável, a Rosa será pessoa e nem será uma má pessoa, será meiga e terá muita vontade de aprender. Uma coisa é certa, irá falar pelos cotovelos!

Sem comentários: